terça-feira, 22 de março de 2011

LEP - Interceptação Telefônica

Da Interceptação das Comunicações Telefônicas
(terça, 21 de março de 2006) - Redigido por Eliane da Silva Taglieta
A Lei 9296, de 24 de julho de 1996, a denominada Lei das Interceptações Telefônicas, regulamentou a parte final do inciso
XII, do art. 5º, da Constituição Federal, estabelecendo as hipóteses e forma de realização da interceptação telefônica,
cessando a discussão a respeito da licitude da prova produzida por esse meio.

De tal sorte que veio abaixo a tese do Supremo Tribunal Federal de que era defesa a realização da interceptação da
comunicação telefônica por ausência de norma jurídica que regulamentasse o permissivo constitucional, a qual
fundamentou diversas declarações de nulidade de procedimentos em processos penais.
O artigo 1º define o objeto da lei, dispondo que “a interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, para prova
em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta lei e dependerá de ordem do Juiz
competente da ação principal, sob segredo de justiça”.

Primeiramente devemos conceituar a palavra interceptação.

Interceptação é o ato ou efeito de interceptar, isto é, interromper, impedir a passagem, é a interferência nas
comunicações, seja ela telefônica ou entre presentes. Consiste na captação de circunstâncias por um terceiro estranho à
conversa, o interceptador, com ou sem o consentimento de um ou alguns dos interlocutores.

A interceptação poder ser telefônica, mediante grampeamento da linha telefônica, ou ambiental (entre presentes), feita por
intermédio de um gravador colocado por terceiro dentro do ambiente onde se localizam os interlocutores.

Para que esteja configurada a interceptação, seja ela telefônica ou ambiental, deve haver a intervenção do terceiro, a terzeità
do direito italiano, elemento fundamental do conceito de interceptação.

Já a gravação é realizada por um dos interlocutores da conversa e denomina-se gravação clandestina, que pode ser
telefônica ou ambiental. A gravação será lícita quando todos os indivíduos tiverem ciência da gravação do som, voz ou
imagem. Será ilícita quando um dos indivíduos ignorar que sua voz, som ou imagem está sendo gravada.

A gravação da própria conversa é um ato lícito, não havendo proibição legal para tal conduta. O que contraria o ordenamento
jurídico é a divulgação dessa conversa, ou seja, tornar público o que deveria ser de conhecimento de um número
determinado de pessoas, pois violaria o direito à intimidade, assegurado constitucionalmente (artigo 5º, inciso X), do
interlocutor que não autorizou a gravação. Existindo, contudo, o consentimento da outra parte pela divulgação não há que
se falar em ilicitude.

Pode haver, entretanto, situações em que haja justa causa e seja descaracterizada a ilicitude de que está eivada a
prova, como na hipótese de comprovação da inocência do acusado. Aqui mais uma vez vemos a aplicação da teoria da
proporcionalidade dos valores em conflito.

Nesse sentido, in verbis:

“Embora sustentável que a gravação clandestina de conversa telefônica pelo destinatário constitui prova obtida por meio
ilícito, porque em violação do direito à intimidade do comunicador, a ilicitude não prevalece e a gravação pode ser admitida
como prova, no processo penal, quando feito pelo réu e apresentada para sua defesa. É que, pelo princípio de
proporcionalidade, predomina, na hipótese, a garantia da ampla defesa sobre o direito à intimidade, havendo justa causa
para a quebra da reserva sobre o conteúdo da comunicação”(TJSP, trecho do voto vencedor do Desembargador Dante
Busana, RT 693/343).

Temos, assim, as seguintes modalidades de interceptação:

1. interceptação telefônica sem o conhecimento de um dos interlocutores (interceptação telefônica stricto sensu);

2. interceptação telefônica com o conhecimento de um dos interlocutores (escuta telefônica);

3. interceptação ambiental sem o conhecimento de um dos interlocutores;

4. interceptação ambiental com o conhecimento de um dos interlocutores;

A interceptação ambiental, seja ela com ou sem o conhecimento de um dos interlocutores, é considerada ilícita por violar
o direito à intimidade, previsto no art. 5º, inciso X, da Constituição Federal. Admite-se somente a violação ao sigilo da
interceptação telefônica nas hipóteses e forma prevista na legislação.

O presente trabalho abordará a interceptação telefônica, matéria regida pela Lei 9296/96, que veio regulamentar a exceção
constitucional relativa à violação do sigilo telefônico como fonte de prova da autoria e materialidade de certos crimes que
afrontam a paz e a segurança social.

A expressão interceptação de comunicação telefônica de qualquer natureza que o art. 1º da lei traz abrange a interceptação
telefônica feita com ou sem o consentimento de um dos interlocutores, isto é, a escuta telefônica e a interceptação estrito
sensu, respectivamente.

Em observância à restrição fixada pela Constituição, foram, então, excluídas as demais formas de interceptação bem como a
gravação clandestina.

Ressalvamos, entretanto, a possibilidade de aplicação da teoria da proporcionalidade nas hipóteses em que houver justa
causa, legitimando-se eventualmente a violação ao sigilo de comunicação, independentemente de previsão legal.

O art. 1º da lei 9296/96 reiterou o disposto na Constituição com relação à utilização da interceptação telefônica somente para fins
investigação criminal ou instrução processual, ou seja, a fase administrativa do inquérito policial e a fase judicial do
processo penal.

A limitação acima fixou a competência para examinar os requerimentos de interceptação de comunicação telefônica.

Desta forma, os pedidos devem ser postulados perante o juiz competente, ou seja, perante o órgão investido de certa
medida de jurisdição para conhecer e julgar os crimes objeto da medida. A competência é do juízo criminal perante o
qual se processará a ação penal principal.

O parágrafo único do mencionado artigo suscitou dúvidas quanto sua constitucionalidade ao estender a exceção
também à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática.

A mencionada lei veio disciplinar o inciso XII, do art. 5º, da Constituição federal, no entanto, ao invés de utilizar a
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expressão comunicação como no texto constitucional, a lei ordinária usou a expressão fluxo de comunicações em sistemas
de informática e telemática, em seu parágrafo único do art. 1º, in verbis:

“O disposto nesta Lei aplica-se à interceptação de fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática”.

“A informática tem por objeto o tratamento da informação através do uso de equipamentos e procedimentos da área de
processamento de dados. A telemática versa sobre a manipulação e utilização da informação através do uso combinado do
computador e meios de telecomunicação: é o caso da transmissão de dados informatizados via modem ou fac-simile”
(Ada Pellegrini Grinover, Antônio Scarance Fernandes, Antônio Magalhães Gomes Filho, As nulidades no Processo Penal,
p.180-181).

Informática está relacionada com processamento de dados e a telemática envolve o conjunto informática e
comunicação por via telefônica.

Em decorrência disso há duas correntes divergentes:

1. A primeira afirma que o parágrafo único do art. 1º é constitucional uma vez que a comunicação em sistemas de
informática e telemática é uma espécie de comunicação telefônica pois se realiza por via de telefone. E, ainda que
entenda-se em sentido contrário, o fato de a Constituição Federal prever somente a exceção para essa espécie de
comunicação, não importa em proibição de se legislar sobre a interceptação de outras formas de comunicação. São adeptos
desse entendimento Alexandre de Moraes, Luiz Flávio Gomes e Damásio E. de Jesus.

2. A segunda sustenta a inconstitucionalidade do dispositivo pois a comunicação em sistemas de informática e
telemática são formas de transmissão de dados que advêm da associação entre os recursos da informática e da
telefonia, não abrangidas pela expressão comunicação telefônica, a única violação admitida. Assim, é defesa a interceptação
da comunicação em sistemas de informática e telemática. Vicente Greco Filho e Antônio Scarance Fernandes
compartilham desse posicionamento.

Fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática envolvem transferência de dados, não sendo,
portanto, abrangidos pela exceção de violabilidade.

Comunicação telefônica “é a comunicação de voz entre duas ou mais pessoas por meio de rede telefônica. Não se confunde
com a comunicação por meio de linha telefônica, que está excluída do âmbito da Lei de Interceptação Telefônica porque não
autorizada sua interceptação pelo art. 5º, inciso XII, da Constituição Federal. Estão fora da exceção constitucional as
comunicações por fax, transmissão de dados, pela internet ou por sistema de modem em geral”( Nelson Nery Junior, Rosa
Maria Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor, p. 2220,
nota 2).

Assim, é certo que os aparelhos de fax e os de modem para seu funcionamento utilizam as linhas telefônicas, mas
transmitem dados, informações codificadas, não se incluindo no conceito de comunicação telefônica. Consequentemente, a
prova colhida a partir das informações oriundas desses aparelhos configurará um ato ilícito já que a inviolabilidade dos
dados é uma garantia absoluta.

Considerando que a interceptação é uma limitação às liberdades públicas, devemos analisar o permissivo constitucional, e
também as disposições na lei ora estudada, restritivamente, de forma a não transgredir a intenção dada à lei e evitar que
abusos sejam cometidos.

Em que pese o avanço tecnológicos e as vantagens advindas dele, inclusive nos meios de comunicação, e em
contrapartida, a preocupação em proteger nossas informações pessoais, o dispositivo constitucional protege a comunicação
dos dados.

A locução comunicação telefônica constante do texto constitucional restringe-se a comunicação verbal, ou seja, a comunicação
de voz estabelecida pelo telefone entre os interlocutores.

As demais espécies de comunicação previstas no parágrafo único da lei são comunicações de dados, invioláveis por
força do texto constitucional, constituindo, portanto, prova ilícita aquela obtida a partir desse recurso.

A Carta Magna estabelece que a regra é a inviolabilidade do sigilo de correspondência, de comunicação telegráfica, de
dados e comunicação telefônica. Continua, dispondo expressamente que a única exceção é em relação ao sigilo dessa
última, sem fazer menção aos sistemas de informática e telemática.

Por conseguinte, a norma constitucional excepcionou a proteção, permitindo a interceptação somente das comunicações
telefônicas, ou seja, a comunicação de voz pelo telefone, e não de toda e qualquer comunicação via telefone.

A ementa da Lei 9296/96 diz: “regulamenta o inciso XII, parte final, do art. 5º da Constituição Federal”. Disso defere-se que
essa lei foi editada com a finalidade de regulamentar a parte final do inciso XII, do art. 5º, da Lei Maior, não cabendo a
ela regular matéria diversa, tão pouco estender a exceção constitucional.

Acrescente-se, ainda, que lei ordinária não é o mecanismo hábil para ampliar o disposto na Carta Magna. Portanto, o
que ela proíbe não pode vir a ser permitido por uma lei ordinária, trata-se de uma questão de inconstitucionalidade da lei.

Conclui-se que o parágrafo único é inconstitucional, já tendo sido, inclusive, objeto de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade, a ADIn 1488-9, na qual foi relator o Ministro Néri da Silveira, proposta pela Associação dos
Delegados de Polícia do Brasil, na qual o Plenário, por votação unânime, conheceu da Ação Direta, mas indeferiu o pedido
de medida liminar por ausência do periculum in mora.

O que nos cabe é interpretar a Constituição Federal e as limitações de poder que ela estabeleceu visando resguardar as
garantias individuais, e não distorcer seus conceitos visando adequá-los casuisticamente alegando interesse público.

Além do que, coexistem dois interesses públicos em conflito, quais sejam, o da apuração da verdade e o da observância
aos direitos fundamentais do cidadão. Entretanto, esse se sobrepõe àquele pois trata-se de direito fundamental, o que não
nos impede de utilizarmos no caso concreto o princípio da proporcionalidade.

Assim, os dados telefônicos estão sob o manto protetor da art. 5º da Constituição Federal mas podem e devem ser
interceptados quando se fizer necessário para proteção de outro direito fundamental de maior relevância que ele,
aplicando-se, assim, a teoria da proporcionalidade.

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Eliane da Silva Taglieta, advogada.
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